sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Reflexões natalinas em tempos de espera

 
Em 22/12/2011

O Natal é um momento de muita simbologia. Talvez tudo em nossa vida tenha um significado para além das aparências. Estamos em constante transformação, imaginando o futuro, lembrando do passado e tentando compreender o presente. Nessa constante filosófica, buscamos elementos que nos liguem a realidade, até para que não nos percamos nos devaneios das sinapses cerebrais, dos vícios dos nossos neurotransmissores. Os símbolos podem ser adorados, cultuados, até mesmo menosprezados, mas, são sempre retomados e as vezes ressignifcados quando o ser humano se sente frágil, quando tem medo, quando descobre suas fraquezas. O próprio nascimento se faz numa passagem, já nascemos mudando, nos transformamos em algo diferente a partir do que já somos, a cada milésimo de segundo. Essa mudança as vezes é tão assustadora que não paramos para observá-la, para admirá-la, entendê-la. Vivemos como se nada acontecesse ou como se não tivessemos tempo para esse tipo de coisa. Mas, todos temos um momento de auto-percepção, de (re)conhecimento pessoal. Por muito, criamos nossos próprios símbolos, desenhamos nossas próprias máscaras para tornar essa passagem aparentemente segura. Cultuamos um ser que é frágil e minúsculo, mas também muito forte e magnífico: nós mesmos. Aceitar os limites, as impossibilidades e a pequines diante de um universo sem limites pode ser algo difícil, e que muitas das vezes nem fazemos, afinal, melhor não pensar nisso, assusta. Se conhecer profundamente, descobrir seu universo interior, talvez seja tão difícil quanto embarcar numa missão espacial. Quantos de nós se olha no espelho e tem a certeza do que vê? É possivel ter a certeza do que se é e do que se quer? Nascemos em uma transformação inesperada. Não sabemos no que nos tornaremos e em parte tentamos moldar nossos desejos, estabelecer padrões e formas adequadas de ser. Por alguns instantes até podemos acreditar nos personagens que criamos para nós. Embora, o reencontro com nossa essência possa ser dolorida, principalmente se nos acostumamos com a pintura que elaboramos sobre nós mesmos. Reencontrar-se, olhar-se diante do espelho e aceitar que você não é como gostaria que fosse, pode ser algo tão sinistro que evitamos fazê-lo. Nossa descoberta é diária, e, ser sincero com  nós mesmos não é algo tão simples quanto parece. Muitas das vezes quem segura o espelho diante de nossa face são os outros, que põem nossas farsas em risco. Mas, increvelmente quando o outro nos força a olhar um pouco mais adentro, somos capazes de recusar nossas mazelas e não aceitar a transformação que somos. Reagimos com ódio, com inveja, com ciúmes. Jogamos a culpa no outro, viramos nosso olhar para outro e mais uma vezes adiamos  o olhar na direção do espelho, o mirar para dentro. Não nos fazemos sozinhos, e portanto devemos parte dessa transformação aos outros, mutantes, que compartilham da mesma experiência de viver. Às pessoas que compartilham suas transformações, as quais podemos ou não somar experiências, devemos sentí-las, como a essência de uma flor se abrindo. Ninguém ensina como florescer, mas a amizade pode tornar mais intensa e perceptível essa passagem (...) As palavras me faltaram para concluir esse texto, o cansaço foi maior. Mas, a inquietação e o incômodo não são pequenos. Continuo me perguntando por que é tão difícil mudar?!


Em 25/12/2011
A feitura deste texto foi instigada por algumas questões, tanto internas quanto externas. Algumas reflexões são próprias dos meus conflitos, outras produzidas pela insatisfação com os dilemas humanos, as mazelas do mundo. Interessante é que ao expelir essas palavras sem muita reflexão, deixei o sentimento aflorar, mas, as palavras ficaram um pouco confusas (pelo menos ao meu ver, que posso acessar meu raciocínio e comparar o que eu escrevi com o que eu queria escrever). A leitura foi, senão influenciada, pelo menos instigada pelo livro “Tempos de espera” do Pe. Fábio de Melo. Estava nas primeiras páginas da obra quando sentei na frente da tela e incondicionalmente deixei me levar por aquelas palavras e inquietações que acabara de ter acesso. Confesso que primeiramente fiquei cético com essa leitura, depois tive preconceito, depois tive vergonha de revelar a admiração pelo que lia. Mas, a identificação foi tamanha, que agora, três dias depois de ter escrito o texto acima, volto à frente do computador para concluir minhas reflexões, agora com a leitura do livro concluída. Fiquei surpreso com algumas semelhanças que encontrei nas páginas seguintes, ao retornar no texto que escrevi (e que agora tento concluir). As semelhanças estão não na qualidade das palavras ou nas reflexões, mas em algumas inquietações e dúvidas que os personagens do livro lançaram, e em algumas comparações, como uma espécie de previsão do que eu leria. Acredito que essas coincidências ou previsões se deram pela identificação com a obra e pela semelhança das questões que me preocupam e que foram por mim encontradas durante a leitura. “Tempos de espera” me ajudou a amadurecer algumas reflexões e a encontrar cúmplices em meus anseios e perguntas. Posso agora retomar alguns de meus raciocínios de forma mais completa. No incício eu dizia que nossa vida é cercada de símbolos. Um desses símbolos é o Natal, que possui seu lugar seleto no mundo dos cristãos, mas até daqueles que não são cristãos, no mundo ocidental, se afetam por esta data. Ressignificada em nossa época as comemorações natalinas extrapolam seu sentido original. Mas, retornando ao seu significado original e cristão, ela trata do nascimento e refere-se à figura de Cristo. Mas, o Natal vai além, pelo seu significado de nascimento, acaba por remeter à idéia de passagem e transformação. A continuidade da história de Cristo vai agregar outros valores, como redenção e ressurreição. E o nascimento identificado pelo Natal refere-se exatamente a uma transformação, representada na vida de um homem, mas que significaria uma mudança social, trazendo novos valores à humanidade. O significado de Natal que temos hoje, alargado com o tempo e adequado ao mundo em que vivemos se distanciou um pouco da sua genética. Esquecemos da sua mensagem de transformação, mas ainda assim é uma data repleta de simbologia e força. O nascimento e a “transformação” pregada por Cristo era profunda e dolorida, sua concretização se daria apenas pelo sofrimento e resignação. E talvez seja essa uma máxima da transformação, o sofrimento e a dor. Aprendi em “Tempos de Espera” que nós somos como rios e nossos amigos como afluentes, que tornam nossas águas mais caudalosas, nos avolumam, nos dão grandeza para enfrentar o percurso até o mar. Os amigos nos ajudam na dor, a compreendê-la e aceitá-la. Em conversas com amigos afluentes (e que se identificam assim porque sentem ao crescer um com outro) sempre usamos a metáfora da lagarta que precisa se transformar na borboleta. Para fazer essa passagem, a lagarta precisa abandonar a segurança e a proteção do casulo. A comodidade que lhe protege precisa ser rompida para que a metamorfose aconteça. Imaginamos que a vida de borboleta, livre e bela seja um desejo da lagarta, um caminho natural. Mas também podemos imaginar que a passagem é dolorida e causa sofrimento na lagarta. Por fim, a liberdade e beleza da borboleta durarão apenas algumas horas, seu auge representa seu fim. A redenção da lagarta é a sua ressurreição. A maior história da cristandade metaforizada pela natureza ou seria o contrário? Essa constatação da efemeridade da vida da borboleta me leva à conclusão que o mais importante seja o processo de mudança, a experiência, do que o auge, ou o objetivo final. Não somos início ou fim, não temos um ponto final aonde chegar, somos acima de tudo passagem. Completar esse processo requer entendimento, aceitação, sofrimento. Como sabiamente recolhemos em “Tempo de espera”, o sofrer por sofrer não tem sentido, mas quando ele acontece dentro de um processo de transformação ele é natural e faz bem. É a semente que morre, para depois dar origem ao broto e a nova vida. Gosto de pensar nos meus amigos como afluentes, que me completam e me engrandecem nessa passagem. Eles me ajudam a entender as mudanças e os sofrimentos experimentados. Por vezes seguram o espelho diante da minha face para que eu veja a lagarta e a borboleta que fazem parte do meu ser. O grande desafio de nosso mundo é compreender o ensinamento da lagarta, o ensinamento da semente, o ensinamento de Jesus! Encontrar a essência de fluxo e correnteza que nos é natural e aceitar o tempo de espera para as mudanças e que muitas vezes não combinam com o imediatismo e o materialismo de nosso tempo pode ser difícil e medonho, porque mudar assusta. Estamos falando de crescimento pessoal, talvez seja essa a máxima do Natal, ou melhor, da Vida... transformação!